terça-feira, 22 de março de 2011

Quando conversamos sozinhos...

Posso dizer que esse texto nasceu há 2 anos atrás. Lembro como se fosse hoje o dia que idealizei. Ao contrário de muitos esse eu nunca esqueci. Muitas vezes lamento essa minha indisciplina pra escrever e até mesmo o medo que tenho de jogar com as palavras. Enfim, isso já expliquei... traumas de uma alfabetização prejudicada... Enfim, vamos ao texto!

Quando conversamos sozinhos...

Era meio da tarde estava eu sentado num boteco que jamais tinha sentando em minha vida. Era São Luis do Maranhão, centro histórico, esperando o tambor de crioula e minha primeira visita por lá. Diga-se de passagem muitas primeiras vezes estava terminando ali... Era última tarde da minha viagem de jeri-delta do parnaíba-lençóis maranhenses, minha 1a viagem sozinho, a 1a vez que nessa viagem me propus beber sozinho. Sem dúvida estava sentindo sensações únicas, pois a viagem foi um enfrentamento ao que minha vida tinha virado, a tristeza que tomava conta e a hipotência de perdas pessoais. Sentia ali uma mistura de alívio, com compreensão e motivação. Sabia que ali era meu último dia daquela vida que tinha acabado de superar.

Comer e beber sozinho já tinha feito algumas vezes, pois moro sozinho desde os 16 anos... Sendo assim teria sido mais triste se nunca tivesse feito isso do que faze-lo. Mas muitas vezes fazemos coisas sem perceber que está em nosso redor. Nossa percepção é parte dos nossos interesses. Ouvimos o que queremos em algumas frases, interpretamos fatos conforme nosso interesse e assim uma gama de coisas. Estando sozinho não é diferente.

Naquele dia estava mais feliz que triste, mas havia tristeza e forte. Entre as tristezas estar sozinho era uma delas. Nunca tinha sido em minha vida, mas ali era. E era pelo fato de estar feliz, ter feito uma viagem maravilhosa e tanta coisa pra contar. A vontade de conversar era grande. Ao mesmo tempo essa angústia virou reflexão e por horas pensei. Foi bom!

Contudo, cansei e não aguentava mais pensar. O tambor de crioula estava longe de começar e o sol começava a baixar. O bar antes deserto passou a encher. Minha mesa que eram duas com 6 cadeiras, já tinha virado uma e restava somente a minha cadeira. Tinha de tudo, de turistas, a moradores e trabalhadores do comércio informal.

De repente começo a prestar atenção no que estou pensando... Parece esquisito, mas não é. Muitas vezes pensamos sem prestar atenção no que é. Foi quando percebi que estava conversando com a mesa do lado. Não era uma conversa de palavras, pois nem a cara das pessoas tinha visto ainda, muito menos aberto a boca. Estava eu escutando a conversa e interagindo na minha cabeça sobre que a pessoa falava. Ou seja, ela contava uma história e eu me perguntava como tinha sido, que não deveria ter feito isso, que legal esse lugar... e por assim foi. Descobri ali que conversamos sozinhos.

Passei a pensar do tanto de conversas no metrô de São Paulo, em restaurantes, em ônibus na época de UNE e em todos os lugares que estive sozinho em que participei. Em umas devo até aprendido algo. Desde então percebi que sempre fazemos isso. Naquele momento minha percepção estava voltada pra minha vontade de conversar, de não estar sozinho e meu interesse fez com que a conversa dos outros tornasse minha conversa. Fiquei no bar durante algumas horas nessa conversa solitária e por horas me divertindo muito. Alguns vão me acusar de intromissão, mas para esses eu digo que não era. Digo isso pelo fato de não querer saber da conversa pra fazer fofoca ou por algum interesse naquilo... ainda mais pq não imagino quem sejam essas pessoas. E para esses ainda afirmo, todos nós fazemos isso, mas nunca prestamos atenção.

Na primeira versão desse texto queria narrar esse evento, mas minha memória não me permite mais. Contudo, sempre quis escrever sobre isso e hoje me veio a lembrança.

Foi um dia esquisito hoje. Um daqueles dias meio depressivos e reflexivos. Não estava feliz. Como bom gordo fui tentar amenizar isso comendo. ;) Escolha foi o melhor japonês que conheço em Brasília. Chegando lá estava lotado e foi me oferecido o balcão. Apertado e inevitável proximidade das pessoas. Sozinho e aguardando meu pedido comecei novamente a conversar sozinho, não por intenção, quando vi já estava longe na conversa do casal ao lado. Me senti desconfortável e comecei a puxar papo com sushiman. (pra quem não sabe fiz o curso do senac de culinária japonesa e sempre que posso sugo um pouquinho do conhecimento dos sushimans). Ocupado pouco sucesso eu tive.

Foi quando começo a participar de uma conversa na mesa de trás. Um homem, mais ou menos da minha idade, narrando seu estilo pegador, azarador, bem sucedido e desapegado. Falando um monte de senso comum. Simplesmente pensei: prego! Olhei pra ver quem era e estava ele com duas mulheres bonitas, pensei: prego sou eu! rs... Chegando minha comida esqueci da mesa em questão. Pedindo a conta volto a conversar solitariamente com a mesa e a moça está falando mal do garotão. “Impressionante!” Eu pensava, pois as críticas que a menina fazia eram exatamentes as minhas.

Foi quando o garotão voltou a falar, a outra mulher tb e voltou pra essa que o críticava... E as palavras dela me impressionaram mais ainda. Dizia: “vocês não estão me entendendo, hj eu acredito no envolvimento racional e não passional, não me deixar levar por qualquer conversinha é isso. Se fosse passional bastaria um papo bom e um rostinho bonito pra achar que achei meu príncipe encantado. Hoje não, o papo e o rostinho são importantes, mas muito mais é saber se curte um som bacana, se curte fazer coisas parecidas e racionalmente eu vou me envolvendo por aquilo vivido”. Nessa hora eu tive que virar pra ver quem era. Parecia que lia meus pensamentos sobre a conversa deles. Falou quase que as mesmas palavras que eu e que tinha pensando durante toda essa conversa. E pela 1a vez que isso acontece, uma conversa solitária em que alguém diz o que eu gostaria de dizer literalmente.

Levantei pra pagar a conta ainda meio sem acreditar, pensando se meu banzo de hoje não teria fabricado essa conversa na minha mente. Paguei e caminhando até o carro fiquei pensando nisso. Foi quando me veio a cabeça aquela tarde em São Luís, quando comecei a prestar atenção nas conversas solitária e percebi que desta vez eu quaaaaaaaaaase me apaixonei por alguém que conversei solitariamente.

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